9/11/08

Querido diário

A Marta faz 30 anos. Queixa-se que mora sozinha com sete gatos e uma colónia de formigas. Para além disso não tem homem. Contudo, ao mesmo tempo fala-me de um tal de um estrelótipo qualquer de idade. Não percebo nada. Mas não acho muito correcto ter relações com idosos, e não imagino a minha amiga a dizer "o sim para todo o sempre" a um fulano chamado Estrelótipo.
A verdade é que para a animarmos resolvemos fazer-lhe uma surpresa. Porque ela pediu para lhe fazermos uma surpresa. Recuando no tempo, lembra-me quando organizei a festa dos seus 18 anos. Para a minha amiga o melhor -pensei eu. Talvez num lugar exótico, quente, de homens suados e comida meio picante. E lá fomos nós, ao frango assado da Caparica. Vi logo que ela gostou. Com aquele jeitinho de olhos muito esbugalhados e inexpressivos que ela sempre tem quando lhe faço estes mimos. Se há pessoa que me adora é a Marta.
Efectivamente, estava tudo programado ao pormenor: o restaurante, a saída e até as viagens. Conseguimos apanhar o autocarro para Cacilhas mesmo-mesmo à hora. Foi um pouco difícil enfiar o urso de 1,5 m dentro das portas do bus mas felizmente uns meninos do bairro do picapau deram uns pontapézinhos no urso a modos que ele lá entrou.

Aparentemente, os meus amigos e a Marta estavam um pouco nervosos com aqueles rapazes tão prestáveis. Não percebi porquê, até porque foram tão cuidadosos que se espalharam
pelo autocarro sentando-se ao lado de cada um de nós. Percebi claramente que estavam preocupados com a nossa segurança e resolveram proteger-nos visto não sermos daquelas bandas. A intenção foi boa mas ainda assim não resultou, sabe-se lá como mas ao chegar ao destino uns maganos tinham conseguido limpar-nos as carteiras. Mas a noite era ainda uma criança e apesar do Paulo estar descalço e a Maria ter desaparecido misteriosamente... agora que me lembro acho que ela nunca chegou a aparecer... bom, ainda assim convenci-os a cumprir com ânimo o programado. A minha amiga, a tornar-se agora uma mulher, merecia um entretenimento à altura. Haviam falado num certo show num bar lisboeta.
Para aqueles que não sabem inglês... show significa "mostrar", ok? Ou seja, calculei logo que fosse algo à altura das noites londrinas ou espanholas, que segundo consta sabem dar fiestas como ninguém. E fomos, a Maria lá havia de arranjar boleia para casa. Aparentemente enganámo-nos.

À chegada achei um pouco despropositado a cama redonda, como se alguém pudesse dormir com música tão alta, e pessoalmente não gosto de cetim porque escorrega muito. Enfim, aproveitei o décor o mais que pude saltando bastante em cima do colchão enquanto dedicava os parabéns à minha amiga no microfone do Élvis Presley. Essa parte foi divertida, até o senhor da música parar o som e puxar-me bruscamente por um braço até à mesa onde a Marta e o grupo me fitavam perplexos. Percebi que também estavam indignados com o azedume daquele homem. Já nessa altura o mundo andava cheio de gente mal disposta.
O show começou e apareceram uns senhores vestidos de senhoras e umas indumentárias que era coisa que nunca tinha visto. Somavam-se cachecóis, penas e chicotes em pleno voo. Muita maquilhagem, corpetes e acessórios. Faziam uma dança desajeitada em cima da cama, e sabe Deus como os homens por norma são desengonçados a dançar, com saltos então e num colchão... Bom, não tinha a beleza de um trocadero... a música era bera... tinha pouca história e os diálogos era só gritinhos, espamos de dor, e sons de chicote a rasgar o ar. Achei fraco. Mas já se sabe, são aquelas modas anglo-saxónicas. Acho que eles também não apreciaram muito. Saíram em silêncio e pareciam muito cansados e absortos. A Marta bocejava muito e repetidamente, pelo que percebi logo que tinha sido uma noite em cheio para ela. Eram 18 anos memoráveis.
Este ano resolvemos fazer uma coisa diferente. Não vou contar-vos já porque aquela marota lê o blog (tás aí doidinha para saber hein?) mas uma coisa vos prometo... será de bradar aos céus. E desta vez não vou em cantigas. Eles ainda não sabem, porque é
surpresa, mas vamos no meu carro e vou eu a conduzir. Nada de riscos desta vez. Tsst-tsst.



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