9/28/07

É o do Nico!


O Nico faz surf há vários anos. E o Nico começou a tirar fotos.

Particularmente interessante é ver os elementos em jogo no surf vistos pela lente de quem vai de facto para dentro de água; que conhece de perto as texturas e tonalidades ambientais que a espera em cima da prancha ou mesmo o regresso cansado ao areal consegue acordar. São os tais detalhes. Na realidade o Nico já tem um blog há vários meses, mas na altura em que ele abriu o seu cantinho aqui O da Joana baixou âncora. Não podia, no entanto, falhar a devida referência. Não só porque é um querido amigo, dos que fazem parte do núcleo mais apertado e estimado de amigos, mas porque tem um talento particular. E tanto assim é que já cativou as simpatias de revistas da especialidade, passo a inconfidência. Acredito que tem muito para dar a este campo da fotografia, na qualidade de praticante e grande entusiasta da modalidade. E cá entre nós, eu gostava mesmo é que vocês o ouvissem a falar de Surf. Dá para sentir as ondas e os canivetes a bater com a temperatura da água. É o Mr. Cool himself a falar do que mais lhe dá prazer. E também por isso o meu mais sincero desejo é que o Nico comece a juntar palavras às imagens que capta. Pode ser que agora, recém-chegado do último Campeonato em França, ele nos dê esse prazer. Beijão, amigo!

9/26/07

Socorro. Quero a minha terapeuta.

A noite já vai longa. A lua bem alta, e nas traseiras alguém ressona como uma betoneira há largas horas. Não, não é o sr. Francisco, o talhante, é mesmo a D. Natacha do Cabeleireiro. Diz que é do amoníaco das tintas que lhe agrava a sinosite. Mas nas traseiras deste pequeno bairro no centro urbano, para lá do submundo das histórias dos gatos vadios, como o nosso Pimpão, o gato que queria ser cão, ou a bela Tareca que queria mesmo era ter nascido gato para poder ser trávéca... bom, para lá dos seus vultos errantes a patinhar silenciosos os telhados, e para lá das cuecas a desequilibrar o velho estendal, já de si assimétrico, abrem-se pequenas janelas para a vida privada. Aqui dentro a noite é bem mais tranquila, escura, silenciosa, e um vulto sossegando o ar debaixo dos cobertores denuncia um sono já profundo. Ou pelo menos assim parece:

"- Cof-COF-Cof.....Hmpf....Cof-cof ... COFCOFCOFcofCOFcof......... iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiihhhhhhhhhhhhhh" (onomatopeia para asfixia temporária. Apesar do fumo a personagem opta por respirar pela boca. burra.) O ambiente é enevoado, e ela prossegue abanando em vão o cenário do sonho:

"- Cof... O gajo da máquina de fumos deve-se ter esquecido daquilo ligado. Bolas"

Na realidade o problema é que há um amigo da nossa protagonista que fuma cannabis a mais, mas como estamos no campo do sonho o Superego exerceu aqui a sua função de censura sobre as imagens que passam neste blog. Ora, depois de alguma dificuldade inicial, foi possível vislumbrar o que ali estava a fazer de facto. Dissipou-se mais. Finalmente, chegava-se à frente, ao balcão da farmácia. Aparentemente teria ido comprar produtos de dermocosmética. "O preço que custa a beleza! bem podem oferecer amostras-brinde" - pensei eu sofrida. Logo a directora clínica se apressa com o seu sorriso de Stepford wife. Foge por breves segundos com um entusiasmo que pessoalmente, pronto, acho meio parvo, para surgir logo de imediato, como que a demorar um suspense qualquer. "Ouça. Eu estou farta de reclamar para o Centro do Ego que não curto estes realizadores pseudo-noirs a dirigir a minha produção onírica. Fui muito clara da última vez em relação à minha preferência pelo registo do Tim Burton. Mas que maçada pá. Tsst. tento resolver isto educadamente e..." E... cortando o meu pensamento em voz off estereofónica a senhora de bata e sorriso e olhar de louça coloca em cima do balcão um bebé lindo embrulhado em lençóis. Pumba:

"- E ... na compra destes produtos da Galénic.... Párabéns!!! Agora é mãe!!!"

Do alto da sua camisa, e do baixo das suas sabrinas pretas, a protagonista diz apenas:

"... merda. e agora? "


Fim de Filme.


6/6/07

Mais da Série "Tudo o que você sempre quis saber e nunca ninguém teve pachorra de lhe explicar"

... Mas eu explico. Que 'O da Joana' está cá é para estas coisas. Desfaçam-se aos poucos por este blog alguns dos grandes mitos ligados às fêmeas. E aqui vos deixo mais um.

Uma eterna questão. Homens e rapazes púberes deste mundo: frequentemente quando surge a expressão "Gostava que olhassem mais para a beleza interior".... na realidade-na realidade... elas estão mesmo é a falar de lingerie. Depois não digam que não avisei.

4/3/07

Ele-há momentos assim, de quase hiato intelectual.


De maneiras que, de momento, a necessidade de ler se impõe feita bigorna em queda livre sobre a necessidade de escrever meia dúzia de patacoadas; pois que esta última (a vontade de escrever), a pobre, resiste trémula de pernas alçadas, feito o (diria miserável!) Coiote debaixo do dito objecto esmagador. Refiro-me portanto àquele bicho esfomeado, com o estômago sempre colado às costas, que levava altos bailes do 'bip-bip', mais conhecido como Road runner. Também pode o leitor socorrer-se da imagem do frigorífico em cima do Roger Rabbitt, se preferir. A imagem mental é à escolha do freguês.

Posto isto, retomaremos assim que possível a produção neste blog, logo após um curto intervalo para uma breve mas abençoada incursão na biblioteca da minha caríssima progenitora, que apresenta títulos perfeitamente provocadores, e cuja extensão de salivação se prolonga desde a prateleira da mitologia, filosofia, grandes obras da literatura, até à estante da história política, antropologia... livros de aut-ajuda. Er... bom, no melhor pano cai a nódoa. Mãe, és G'rande! E não ligues às más línguas. Da última vez que te medi, pelo menos um metro e cinquenta era de certezinha.

E porquê? Porque eu preciso. Porque há seis anos que tenho sede de ler coisas que não tenham exclusivamente a ver com Psicologia. Ler, e com tempo! Que isto de conhecer obras importantes de trezentas páginas, como 'Os Tristes Trópicos', ou até mesmo as curtas cem páginas do 'Raça e História' de Lévi-Strauss, a correr para um exame, deixam uma sensação amarga de que não degustámos a coisa com a serenidade e elaboração que nos merece.
Afinal das contas, estamos no período da Quaresma e este cérebro precisa de lutar pela ressurreição. Começarei pelos clássicos.

Palavra do Senhor!


3/9/07

O Labirinto do Fauno



... É um conto de fadas para adultos. Uma viagem fascinante que segue a estrutura clássica dos contos tradicionais. A este propósito aconselha-se a leitura da 'Psicanálise dos contos de fadas' de Bruno Bettelheim porque palavra de honra que o filme se torna ainda mais saboroso de apreciar, e mais perceptível nos seus conteúdos latentes.

A pequena Ofélia (a heroína) apresenta-se com fortes remniscências da Alice de Lewis Caroll, mas rapidamente a semelhança de roupagens se perde, curiosamente 'na mesma árvore' onde Alice adormece de livro na mão. Também é ali que Ofélia avança para o primeiro dos seus desafios, mas a viagem que lhe é proposta está bem mais de acordo com a morfologia dos contos tradicionais conforme o folclore popular, do que com as dinâmicas esquizofrénicas do autor de Alice nos país das maravilhas. E rapidamente nos esquecemos de Caroll.

Na sua essência, Labirinto do Fauno é um conto de terror, como são no fundo todos os contos de fadas originais, em que o protagonista-criança é posto à prova. Guillermo del Toro consegue com este filme estabelecer um paralelo de universos entre as lutas infantis pelo crescimento, e aquelas outras dos adultos, de autonomia e liberdade (sendo que o contexto é o do pós-guerra civil espanhola). Parte do brilhantismo do filme reside aí... a luta de Ofélia por conquistar o seu lugar de princesa (metáfora para o fluorescimento psicológico da jovem mulher) desenrola-se a par das guerras reais dos adultos por conquistar a liberdade de existir enquanto indivíduos. E se a primeira se desenrola ao nível do imaginário (como aliás é suposto na infância) a segunda cresce num plano bem real, com todos os horrores característicos das guerras dos homens, e consequente castração da individualidade -materializada em torturas medievais e homicídios levianos por parte do 'gajo bera' da história.

A beleza da coisa cresce quando a estética do real e a do imaginário se tocam e se fundem. A luta torna-se uma só, aproximando a infância e a adultícia a um vector único em continuum, naquele encontro abraçado entre Ofélia e Mercedes em que a pequenina pede "Leva-me contigo". Do ponto de vista psicológico, estas personagens surgem quase como um desdobramento da unidade psíquica criança-mulher, cada uma lutando em seu plano, até que estejam preparadas para se encontrar e unir esforços. Dizia que parte do brilhantismo do filme reside aí... em mostrar que crianças e adultos são feitos do mesmo tecido sonhador e receoso, e que evoluir (independentemente da idade) é um jogo sensível de articulação entre os dois.

No que diz respeito à genialidade do conto tradicional enquanto objecto artístico que, à semelhança do mito, encena os grandes dilemas existenciais, os seus elementos chave estão todos neste filme: Os objectos mágicos que garantem ao herói a coragem para acreditar que pode superar os obstáculos; os seres mágicos (fadas e fauno) que asseguram e pontuam o desenrolar das peripécias; a mágica do número três associada às tarefas sobrehumanas que o herói tem que superar (sinónimo de paciência e endurance perante as dores de crescimento); as figuras adultas autoritárias que garantem a frustração necessária para o despontar da rebeldia; a necessidade de seguir o instinto infantil corajoso (fascínio pelo desconhecido) para explorar criativamente soluções vitoriosas; a cedência momentânea às pulsões infantis (voracidade oral) como sinal de resistência à 'saída do ninho'; a cadência e o suspense; o sangue e o sangramento feminino enquanto símbolo de vida; a morte simbólica da mãe encenando a substituição geracional; bem como todos os elementos do natural (bosque, água) que circunscrevem a história a um lugar e um tempo reais mas que, por serem suficientemente indefinidos, garantem a regressão necessária a um 'era uma vez há muito tempo',o qual facilita a projecção e identificação com dilemas difíceis de trazer à consciência.

Os contos tradicionais deixam os seus protagonistas sempre órfãos não por crueldade mas porque o imaginário colectivo reconhece que o processo de individuação é um caminho interno, intrapsíquico, individual, e nesse sentido 'órfão'; e valida esse sentimento através do jogo simbólico de limpar o sarampo às figuras 'protectoras' sem meias medidas logo ali nos primeiros capítulos. Assim se concentra a trama na narrativa individual da criança-herói, e em todas as aventuras que se irão seguir.

Isto porque a temática central de qualquer conto ou mito será sempre desvendar O sentido da vida. Ele fervilha ali nas histórias, em formato de semente pronta a ser recolhida pela capacidade de cada um de sonhar. E o onírico é, acima de tudo, a possibilidade individual de configurar o futuro de acordo com o desejo único e intransmissível de cada um, de ser-no-mundo não menos do que aquilo que já é no seu ideal do eu.

E não é que a nossa Ofélia se vai sair lindamente e ser feliz para sempre e mais não sei o quê?

Os cinéfilos que comentem a realização, a fotografia, e todas aquelas coisas das quais eu só posso dizer 'gostei muito'. E a miúda tem uma interpretação fora de série. Que tem.

2/28/07

Cof...Cof....!!!

Shiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiuuuuuuuu 
[Perlóim-perlóim]


O faduncho do malandro borracho


Eeeeeeeeee-aaaaaaAAi.

[Perlóim.]

Ainda-lá-vinhas-desajeitado

de sono mal acordado
Ainda-entortavas-a-calçada-meio-ressacado
Já meu peito pulsava
este fadinho apaixonado.

É sempre assim

Ainda o dia não rebentou
Já antecipo ao longe a chatice
E o caldo que entornou

[Aaaaai. Cuidado a atravessar essa estrada].


E de dares meu beijo, nada

Que passo por antiquada
De não confessar a timidez
Pá próxima saia como saia
Levas-co' estes-lábios-d-uma-vez.

[E se quiseres chama-me de danada.

Mas com essa idade tão avançada não-perdes-pla-demora.]

Lembro bem o dia do primeiro beijo

Perguntaste-o-que-fazia-quem-eu-era-
"que-mal-te-vejo"
que estavas com o alemão, e respondi, 
se gostasses mais de mim [bis]
eu cá não me importava, não.

Aaaaaaaai meu malandro.

com-o-teu-jeitinho-desalinhado
Teu-parco-cabelo-desgrenhado
Me-deste-cabo-do-coração
E nunca mais eu me vi endireitar
Para outra direcçãaaao.

[Endireita a dentadura amori, olha as pessoas.]


Podias até chamar-me torta

E mentiras assim.
Para me entortar contigo
Até que endireitava
E-podes-crer-até-soava
a-doce-castigo-para-mim.

Que pra mal da minha boca

És um magano que desatina
Só perto dos teus lábios
ou da guitarra aqui do Zé
é qu'esta magana afina.

[Anda lá com essa guitarra Oh Zé]


(remate de conversa com trejeito de pescoço. Pausa pá guitarrada)


[Ora vamos lá a isto...]


E se essas outras mulheres

Perguntarem por ti
digo que és assim-assim
Mulher é bicho invejoso.
E nao fiando  nesse falar dengoso

És viril, nobre, e forte

Lá à tua maneira, enfim.
Meu Deus, a sorte
De-emcabestar-co'-um-velho-assim.

(Sobem as guitarras a antecipar o clímax)


Que ele é malandro, é sim senhora.

mas não é por mal
Só gosta de beber seu copito
Mais-uns-dois-ou-três-e-tal.

Mas no fundo, no fundo

No fuuuuuu-u-undo
E homem frágil, coração mole
e na vida só anda direito
quando se equilibra no meu peito.

E a arritmia daquele coração

só sossega a descansar no meu
E malandra que o queira logo a ponho a andar
Que este malandro até já está a ressonar
Mas o malandro borracho é meeeeeeu!

Perlóim-Perlóim!







A partir de uma noite de fados. Ela trazia a mouraria à cintura, e os modos de falar da Alfama que a adoptou. Era alta, loura, madura jovem e de grande peito maternal. Abria a boca que era uma agressão à alma. Ele trazia na voz, e no equilíbrio trôpego, o cantar de quem já cantou bem, noutros tempos talvez. Jocosos não eram seus fados, mas sim o seu cenário. E enquanto ele cantava, encantando as mesas com o fado da ‘manhosa’, ela lançava-lhe piropos apaixonados de quem ameaçava levá-lo para casa nessa noite. E o que é certo é que eles saíram primeiro do restaurante.  Nós ficámos agarrados às guitarras. Agora por falar nisso... quem é que terá fechado o restaurante nessa noite?

2/12/07

Da alegria que há na Almedina e na Fnac: Campanha de angariacao de fundos

Joana é uma jovem de vinte e sete anos. Joana podia ser sua filha, sua mãe, sua tia, sua irmã, sua enteada, sua namorada, sua dominatrix, seu cachorrinho, sua professora da primária, sua empregada na lavandaria, sua contabilista, advogada, ela podia ser o seu homem do talho, o seu bate-chapas, o homem do totoloto, o seu ponta de lança favorito, seu ódio de estimação, ela podia ser a sua empregada romena licenciada em geofísica espacial com doutoramento em arquitectura de interiores pela NASA. Joana poderia ter tido um nome que não fosse associado a um insecto que só tem sucesso sob a forma de cinzeiro, saboneteira, mochila, almofada, porta-fotografias, aventais eróticos e afins. Mas não. Até nisso teve azar. Joana é uma jovem quase-recém-licenciada... em Portugal.

Contribua você também para esta causa. Deixe o seu donativo com uma listinha aqui.

Hoje pelo meu fluorescimento intelectual, amanhã pode ser pelo seu!

Agora todos juntos... We are the wor'd ... we are the children...[enquanto abrimos caridosamente as carteiras]... we are the ones who make a better day so let's start giving.... GÍ-VÍIII-IIIII-IIIIIING (momento dramático das back vocals)... [ seleccionar no menú a função consulta de saldo]... There's a Choice you're makiiiiiiiiiiiiiiiiiiing (entra o Stevie Wonder... sai o talão)


Campanha 'Um beicinho a menos pela cultura'
Conta Caixa Geral de Depósitos: 0000006789012345























1/28/07

Mais uma...

da série Tudo aquilo que sempre quis saber e ninguém teve pachorra para lhe explicar : um ensaio (quase) etológico.


Desenganem-se. Aquilo a que uma fêmea aspira verdadeiramente não é um macho que saiba discutir com ela o Zodíaco, mas antes aquele macho-alfa que a obriga em segredo a ir ao dicionário. Isso sim, dá pica.

1/25/07

Síndrome do Cólon Irritável


Prometo que não volto a comer alheira de mirandela com batatas fritas e ovo estrelado às onze da noite

Prometo que não volto a comer alheira de mirandela com batatas fritas e ovo estrelado às onze da noite


Prometo-prometo-prometo que não volto a comer alheira de mirandela com batatas fritaseovo-ai-ai-ai-ai-ai-ai-ai-ai-ai-ai-aiai-ai-ai-ai-ai-ai...-Mmmunf!...ai-ai-ai-ai-ai-ai-ai...àh!

1/23/07

Acho que tenho um problema

... que envolve queijo fresco e doses consideráveis de requeijão de Seia. Às vezes com uma cobertura de doce de abóbora e nozes picadas.
Tudo começou com uma simpatia platónica pelo rapaz da charcutaria. A maioria dos que lá iam procuravam a singela farinheira ou a morcela de arroz, e sabiam distinguir entre aquela da Beira e a do Alentejo. Eu não. Naquele dia entrava no estabelecimento à procura de bolacha torrada e um pacotinho de açúcar, apenas e só. Foi quando ele me disse lá do fundo do balcão: "Então e um queijinho, não vai?". "Er..." -balbuciei. "Olhe que este é daqui!"- insistiu o rapaz puxando o lóbulo da orelha. E eu que sempre tive uma simpatia particular pela orelha de um bom moço anuí, roborizada: "Bom, se é daí...então eu levo".
O tempo passava, e rapidamente sucumbi ao consumo diário de queijo. Em pouco tempo ele apresentou-me todas as variedades de flamengo e emental, o Feta para temperar a rúcula, aqueles mais sofisticados para consumir disfarçadamente em festas privadas com os amigos e, como quem se mete no queijo acaba inevitavelmente derretido, não tardaria a cair nos amanteigados regionais, agora já sem qualquer possibilidade de redenção. É. Foram os quatro dias mais longos da minha vida.
Vendo-me tão dependente e, acima de tudo, bom... tão gorda, o rapaz deu-me o seu golpe de misericórdia, e num dia já depois do horário de expediente, alumiados apenas pelas montras de refrigeração temperadas pelo cheiro a presunto espanhol, ele disse-me: "Miúda, tu toma-te conta. Fica-te pelo queijo fresco e pelo requeijão, que isto é material que não faz mal a ninguém". Famous last words, imediatamente antes de fugir para o sul de frança com uma manequim anoréctica, já muito janada em Roquefort.
Destroçada e de queijo na mão, engoli o desgosto inteiro, sem sal nem pimenta, nem nada. Mas como dizia o tal Pavlov, uma vez retirado o estímulo persiste o comportamento condicionado. Já não me lembro do nome do rapaz e a única recordação que mantenho do seu lóbulo orelhal é uma camada absolutamente absurda de pêlos, cujo alvoroço passional daquele momento não me permitira ver, mas a queijice, essa continuava.
Hoje percebo que não há como voltar atrás, que tenho de me virar para a compota ou para a marmelada, mas o caminho para o recovery é tortuoso e difícil. Um dia de cada vez. E portanto, decidi começar pelas sessões de grupo. Hoje vai ser o meu primeiro dia.


- Er... Boa noite, o meu nome é Joana, e bom...

- Mmmmmmmmm...Oláaaaaaaaa Joaaaaaaaaana (coro!)

-... Olá-olá...bom, eu sou viciada em queijo. Pronto, está dito.

- Sim Joana...hehehe...pois. Sabes que nós, viciados em sexo, por vezes escamoteamos o nosso problema com humor, mas na realidade não há problema algum em...

- COMO?!..Não. Devo-me ter enganado na sala concerteza, então até loguinho sim?

- Joana-Joana, nós sabemos bem que ninguém aqui se enganou na sala, não é grupo?...

- Mmmmmmmmmm... Siiiiiiiiiiiiim Joaaaaaaaaaaaaaana (Coro!)

- ... Há coisas difíceis de admitir eu sei. Mas experimenta desta vez ficar só a assistir. Aceitas um cafézinho e uns canapés de queijo serpa?...Vá.

- Er... (DWOP!!!) uns dez minutinhos então.